Na noite do último domingo, o Brasil viveu um momento histórico no Oscar. O filme Ainda Estou Aqui, indicado em três categorias, conquistou a estatueta de Melhor Filme Internacional, um feito inédito para o país. Essa vitória representa não apenas o reconhecimento de uma produção brasileira, mas também uma mudança significativa na visibilidade do cinema nacional no cenário internacional. Especialistas apontam que essa conquista pode ser um marco para a valorização do setor e a abertura de novas oportunidades para cineastas brasileiros.
Para o cineasta Iberê Carvalho, as indicações ao Oscar são um sinal de que os estereótipos sobre o cinema brasileiro estão sendo quebrados. Ele ressalta que, apesar da qualidade das produções nacionais, o mercado interno é amplamente dominado por filmes estrangeiros, o que torna essa vitória ainda mais significativa. A crítica de cinema e votante do Globo de Ouro, Fabiana Lima, reforça essa perspectiva, lembrando que o cinema brasileiro enfrentou dificuldades nos últimos anos devido ao sucateamento da indústria cultural. Agora, com essa conquista, há uma esperança de reaquecimento do setor.
A professora da Universidade de Brasília (UnB) Rose May destaca a importância da visibilidade internacional que Ainda Estou Aqui trouxe para o Brasil. Segundo ela, a premiação pode atrair investimentos para roteiristas, diretores e demais profissionais do cinema, criando um ecossistema mais favorável para a produção audiovisual nacional. O crítico de cinema Márcio Sallem lembra que, apesar do Oscar ser uma vitrine importante, o cinema brasileiro já é reconhecido em festivais de prestígio, como Berlim e Veneza. No entanto, a visibilidade proporcionada pela Academia pode impulsionar ainda mais a presença do país no mercado global.
O sucesso de Ainda Estou Aqui não se limitou à premiação. No Brasil, o filme arrecadou mais de R$ 104,6 milhões nas bilheteiras, tornando-se uma das maiores bilheterias do cinema nacional desde 2018. Com mais de 5,1 milhões de espectadores no país, o longa também se destacou internacionalmente, acumulando aproximadamente R$ 159 milhões ao redor do mundo. A exibição em 420 das 439 cidades brasileiras foi um marco histórico, demonstrando o potencial do cinema nacional em atingir públicos diversos.
Nos Estados Unidos e no Canadá, Ainda Estou Aqui arrecadou cerca de R$ 24,8 milhões desde sua estreia em janeiro. Após as indicações ao Oscar, o filme atingiu um pico de exibição em 704 salas nos EUA, evidenciando o interesse do público internacional pelas produções brasileiras. Para Iberê Carvalho, esse sucesso é um indicativo do potencial de crescimento do mercado interno, desde que haja investimentos e políticas públicas adequadas para fortalecer a indústria cinematográfica nacional.
A distribuição de filmes brasileiros no próprio país ainda é um desafio. A professora Ivana Bentes faz uma analogia com o futebol, afirmando que há muitos talentos escondidos no Brasil que precisam de mais oportunidades e visibilidade. O engajamento do público é um fator crucial para essa expansão. Nas redes sociais, a campanha de Ainda Estou Aqui mobilizou milhares de pessoas, promovendo o filme em nível global. O impacto digital foi tão grande que influenciou a percepção de votantes da Academia, mostrando a força do cinema nacional e a paixão dos brasileiros por suas produções.
O futuro do cinema brasileiro parece promissor após essa conquista. A expectativa é que o país não leve mais 25 anos para voltar ao Oscar, como aconteceu entre Central do Brasil e Ainda Estou Aqui. O reconhecimento abre portas para novas produções ganharem destaque, como O Último Azul, de Gabriel Mascaro, vencedor do Urso de Prata no Festival de Berlim, e o próximo filme de Kleber Mendonça Filho, que será lançado no Festival de Cannes.
Além do impacto cinematográfico, Ainda Estou Aqui tem um papel fundamental na educação histórica e na memória coletiva do Brasil. Ivana Bentes enfatiza que o filme é essencial para jovens que desconhecem o período da ditadura militar, trazendo uma narrativa contundente sobre os crimes cometidos na época. Em um momento em que o negacionismo histórico ganha espaço, produções como essa ajudam a preservar a verdade e a estimular o debate sobre a importância da democracia.
O impacto do filme também chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF), que está prestes a decidir sobre a aplicação da Lei da Anistia a crimes como sequestro e cárcere privado cometidos durante a ditadura. Esse desdobramento reforça a relevância do cinema como ferramenta de reflexão e transformação social.
A história escrita por Ainda Estou Aqui no Oscar 2025 é apenas o começo de uma nova era para o cinema nacional. Com maior reconhecimento internacional, engajamento popular e um mercado em expansão, o Brasil tem a oportunidade de consolidar sua presença na indústria cinematográfica global, trazendo mais histórias autênticas e impactantes para as telas do mundo.