A participação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, na cerimônia de inauguração de um trecho duplicado da BR-163 em Diamantino, no Mato Grosso, reacendeu discussões sobre os limites das atribuições do Judiciário no Brasil. O evento, realizado em 5 de janeiro de 2025, celebrou a entrega de 100 quilômetros de rodovia reformada, mas foi marcado por controvérsias que transcenderam a relevância da obra. Além de Mendes, estiveram presentes na solenidade o ex-presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas, e o prefeito de Diamantino, Chico Mendes, irmão do ministro do STF.
A presença de Gilmar Mendes na cerimônia foi alvo de críticas por setores da política e da sociedade civil, que consideraram inadequada a participação de um ministro do Supremo em um evento típico da administração pública. Para muitos, a função do STF é garantir a interpretação e aplicação da Constituição, e não se envolver em inaugurações de obras públicas. Esse posicionamento foi amplamente reforçado pelo deputado estadual Gilberto Cattani (PL-MT), uma das vozes mais críticas ao ocorrido.
Em entrevista ao programa “Raio X da Política”, Cattani expressou indignação com o papel de destaque ocupado por Gilmar Mendes na cerimônia. O parlamentar argumentou que a presença do ministro transmitiu a impressão de que ele estaria se apropriando politicamente de um projeto cuja execução não foi fruto de sua atuação. Segundo o deputado, a duplicação da BR-163 foi viabilizada graças aos esforços do ex-presidente Jair Bolsonaro e do ex-ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, cujas contribuições não foram mencionadas durante o evento.
Cattani declarou que a ausência de referências ao trabalho de Bolsonaro e Tarcísio de Freitas foi um desrespeito à realidade dos fatos. Para ele, o evento foi deliberadamente conduzido para apagar os méritos das figuras que desempenharam papéis centrais na realização do projeto. O deputado foi categórico ao afirmar que a postura de Gilmar Mendes, ao assumir o protagonismo na inauguração, era inadequada para um membro do Judiciário.
A cerimônia, que deveria ser uma celebração da conclusão de uma obra aguardada há anos pelos moradores de Diamantino e de outras cidades ao longo da rodovia, acabou se transformando em um palco de questionamentos éticos e políticos. A relação familiar entre Gilmar Mendes e o prefeito da cidade, Chico Mendes, foi outro fator que alimentou as críticas. Para muitos, a presença do ministro foi vista como um gesto que extrapolou os limites institucionais, comprometendo a imparcialidade esperada de um membro da mais alta corte do país.
No discurso oficial, Gilmar Mendes destacou a importância da obra para a economia regional, ressaltando como a duplicação da BR-163 traria melhorias significativas para o transporte e a logística no estado do Mato Grosso. Contudo, suas palavras não foram suficientes para dissipar o desconforto gerado pela sua participação no evento. Muitos observaram que a cerimônia foi conduzida de maneira a reforçar a figura de Mendes como uma liderança local, o que despertou críticas sobre uma possível politização da sua imagem.
Além das questões éticas levantadas, a situação também reacendeu o debate sobre o envolvimento de membros do Judiciário em atividades que extrapolam suas funções. O Brasil tem testemunhado, nos últimos anos, uma crescente participação de ministros do STF em eventos políticos e sociais, o que tem gerado questionamentos sobre a separação de poderes e os limites de atuação do Judiciário.
A duplicação da BR-163, embora reconhecida como uma conquista para a infraestrutura regional, tornou-se um exemplo de como obras públicas podem ser utilizadas como instrumentos de disputas políticas. Para a população local, a conclusão do projeto representa um avanço importante, mas a controvérsia sobre a presença de Gilmar Mendes ofuscou, em parte, os benefícios da realização.
No plano nacional, a presença de Mendes no evento também foi interpretada como um reflexo das tensões políticas que permeiam o país. Em um momento de polarização intensa, atos que antes poderiam passar despercebidos agora ganham proporções maiores, com interpretações divididas entre diferentes espectros ideológicos.
A figura de Gilmar Mendes é historicamente marcada por sua relevância no cenário político-jurídico brasileiro. Contudo, sua atuação fora do tribunal tem despertado reações divergentes. Para críticos como Gilberto Cattani, a presença de Mendes em Diamantino foi mais um exemplo de como a imagem do Judiciário pode ser utilizada para fins que fogem de suas atribuições constitucionais.
O episódio levanta um questionamento mais amplo sobre o papel que figuras públicas, especialmente aquelas em cargos de alta relevância institucional, devem desempenhar em eventos que envolvem a administração pública. Enquanto alguns defendem que Mendes, como cidadão e figura pública de destaque, tem o direito de participar de uma cerimônia em sua cidade natal, outros apontam que essa escolha compromete a percepção de imparcialidade e neutralidade do STF.
Em meio às críticas, a conclusão da duplicação da BR-163 permanece como um marco para o Mato Grosso, melhorando a qualidade das estradas e impulsionando o desenvolvimento regional. No entanto, o impacto positivo da obra foi, em parte, ofuscado pela controvérsia em torno da cerimônia.
A situação em Diamantino é mais um episódio que reforça a necessidade de uma discussão mais profunda sobre os limites entre os poderes no Brasil. A participação de ministros do STF em eventos de natureza política ou administrativa deve ser analisada com cautela, especialmente em um momento em que a confiança nas instituições está sendo constantemente testada.
Para o futuro, a polêmica pode servir como um alerta para que as fronteiras entre as funções dos diferentes poderes sejam mais claramente respeitadas. Enquanto isso, a duplicação da BR-163 permanece como uma obra de destaque no Mato Grosso, lembrada tanto por seus benefícios quanto pelas controvérsias que a cercaram.