Nos primeiros dois anos do governo de Jair Bolsonaro, o Brasil registrou um número maior de apreensões de armas de fogo do que no mesmo período da gestão atual de Luiz Inácio Lula da Silva. Dados do Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública (Sinesp), vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, apontam uma diferença de 6,1% entre os dois governos. Entre 2018 e 2019, durante o governo Bolsonaro, foram apreendidas 221.244 armas de fogo, enquanto nos anos de 2023 e 2024, sob a gestão Lula, esse número caiu para 207.679.
Especialistas do setor afirmam que a apreensão de armas está mais relacionada à atuação das polícias estaduais do que a uma política específica do governo federal. O conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Roberto Uchoa, destaca que essas ações são executadas principalmente pelas forças de segurança estaduais, sem influência direta das diretrizes federais. Segundo ele, os dados são fornecidos pelos estados e consolidados no Sinesp, que funciona como uma base nacional, mas que reflete prioritariamente as iniciativas locais. Ele também ressalta que nenhum dos dois governos estabeleceu uma política efetiva para combater o tráfico de armas.
O Ministério da Justiça e Segurança Pública esclareceu, por meio de nota, que apenas disponibiliza os dados estatísticos enviados pelas secretarias de segurança dos estados e do Distrito Federal, sem realizar análises sobre as causas ou implicações dessas apreensões.
Entre os estados, Minas Gerais lidera o ranking de apreensão de armas, sendo responsável pelo maior volume nos últimos seis anos. De 2019 a 2024, o estado registrou a apreensão de 118.429 armamentos, um número significativamente superior ao de São Paulo, que ocupa a segunda posição com 70.853 ocorrências. Para Uchoa, esse resultado se deve principalmente às estratégias adotadas pelas forças de segurança locais e a fatores como o aumento da circulação de armas ilegais e a intensificação das ações policiais.
Os tipos de armas apreendidas também mostram uma tendência preocupante. Entre 2019 e 2024, houve uma redução na apreensão de revólveres, que passaram de 38,8% para 34,4% do total, enquanto pistolas aumentaram de 17,1% para 29%. O fuzil, um armamento de alto poder letal, teve um crescimento expressivo, passando de 1.023 apreensões em 2019 para 1.957 em 2024. O Rio de Janeiro se destacou nesse aspecto, retirando de circulação 732 fuzis apenas no último ano, o maior número registrado na última década. Outros armamentos como rifles e metralhadoras também tiveram aumento na apreensão.
Esse fenômeno reflete uma mudança no perfil das armas utilizadas em crimes no Brasil. Para Uchoa, essa transição é alarmante, pois indica um crescimento do arsenal de alto calibre nos mercados ilegais. Ele destaca que a substituição progressiva de revólveres por pistolas e a disseminação de armamentos mais potentes elevam o potencial de letalidade das ações criminosas no país.
O aumento na apreensão de armas mais potentes pode estar relacionado a diversos fatores, como o crescimento do número de armas em circulação no período recente e o fortalecimento de grupos criminosos organizados. Também pode ser reflexo de um maior investimento das polícias estaduais em operações específicas de combate ao tráfico de armas, o que explicaria o crescimento expressivo das apreensões nos últimos anos.
Embora os números demonstrem diferenças entre as gestões Bolsonaro e Lula, especialistas ressaltam que os governos federais têm impacto limitado sobre as apreensões, pois a responsabilidade recai majoritariamente sobre os estados. A eficácia das políticas públicas nesse setor depende, sobretudo, do investimento em inteligência policial, da cooperação entre os órgãos de segurança e da capacidade de resposta das forças de segurança estaduais frente ao avanço do crime organizado.
A questão da segurança pública e do controle de armas continua sendo um dos desafios centrais para os governos e a sociedade brasileira. O crescimento na apreensão de armamentos de maior poder letal acende um alerta sobre a necessidade de políticas mais eficazes para coibir o tráfico e reduzir a violência. Com o aumento da circulação de armas no país, torna-se fundamental um trabalho conjunto entre os órgãos estaduais e federais para enfrentar esse problema de forma mais ampla e coordenada.