O ex-apresentador Sérgio Chapelin, que durante décadas marcou presença no Jornal Nacional com sua voz firme e seu tom sereno, surpreendeu o público ao abrir o jogo sobre sua visão política e experiências marcantes de sua trajetória. Em uma entrevista recente, Chapelin revelou sua identificação com ideias de esquerda, seu voto no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em duas eleições e os desafios que enfrentou como jornalista durante o regime militar. Conhecido por sua discrição, o veterano do jornalismo agora compartilha reflexões que misturam vivências pessoais e observações sobre os caminhos do Brasil.
Sérgio Chapelin, apesar de nunca ter se declarado militante, explicou que sua origem humilde sempre o conectou às pautas da classe trabalhadora e às ideias progressistas. “Minha situação de vida me obrigou a estar ao lado da classe trabalhadora. Venho de uma família humilde, meus pais nunca tiveram casa própria, e eu não herdei nada. Nunca fui militante de um partido ou de uma causa específica, mas sempre me identifiquei como uma pessoa de esquerda”, disse. A relação com esses ideais, segundo ele, foi algo natural, moldado pelas dificuldades que enfrentou em sua juventude.
Um dos momentos mais marcantes da entrevista foi quando Chapelin revelou ter votado em Lula por duas vezes, citando sua admiração pela trajetória do ex-presidente. “Votei no Lula na primeira vez e também na segunda. Depois disso, parei de votar em candidatos de um lado ou de outro. Estou esperando surgir um nome que realmente inspire confiança”, afirmou. A declaração chamou atenção, já que o jornalista sempre manteve uma postura neutra em público, especialmente durante sua longa carreira em emissoras como a Globo, que priorizam a imparcialidade jornalística.
Chapelin também abordou um período sombrio da história brasileira: os anos da ditadura militar. Durante esse tempo, ele trabalhou na Rádio JB e experimentou de perto os rigores da censura. Ele relembrou o ambiente tenso das redações e a presença constante de censores, que avaliavam cada palavra antes de ir ao ar. “Eu tinha um censor ao meu lado no estúdio. Entregava meu texto para ele, e só depois que ele aprovava é que eu podia ler as notícias”, relatou. Chapelin destacou como a censura limitava a atuação dos jornalistas e impunha um clima de medo. “Era preciso ter cuidado o tempo inteiro. Não podíamos nos distrair, porque o controle era absoluto.”
Um dos episódios que mais o marcou foi o contato direto com censores conhecidos por sua rigidez, como um apelidado de “Durango Kid”, que, segundo Chapelin, simbolizava o controle opressor da época. Ele descreveu como os jornalistas tinham que adaptar rapidamente seus conteúdos para evitar represálias, enquanto lutavam para informar a população. “A ditadura não era brincadeira. Era uma época de silenciamento e de muita insegurança para quem trabalhava com comunicação. Falo para os meus netos o quanto foi difícil viver aquele período.”
As declarações do ex-apresentador chegam em um momento de intensos debates políticos no Brasil. Chapelin fez questão de reforçar a importância de manter viva a memória sobre o regime militar e alertou sobre os perigos do autoritarismo. “As gerações mais novas precisam entender que aquilo não foi apenas uma questão de governo ou política. Era uma época em que as liberdades individuais estavam constantemente sob ameaça, e isso deixava marcas profundas na sociedade.”
Apesar das críticas ao regime militar, Chapelin evitou adotar um tom agressivo ou polarizador. Ele destacou que suas reflexões não têm a intenção de alimentar conflitos, mas de provocar uma análise mais ampla sobre os rumos do país. “O Brasil já passou por muitas fases difíceis. Ainda estamos em busca de um caminho mais justo, que traga oportunidades reais para todos. Espero que as pessoas reflitam sobre isso.”
Longe das câmeras, Chapelin leva uma vida tranquila, mas continua acompanhando de perto os acontecimentos políticos e sociais. Seu tom sereno e sua habilidade em traduzir questões complexas de forma clara continuam sendo suas marcas registradas, mesmo agora, fora do telejornalismo. Ele também demonstrou certa nostalgia ao recordar sua trajetória e os desafios que enfrentou ao longo de sua carreira. “O jornalismo me ensinou muito, não só sobre o mundo, mas também sobre mim mesmo. Tenho muito orgulho do que fiz, mas também sei que o Brasil ainda precisa avançar muito em questões fundamentais.”
As palavras de Sérgio Chapelin ressoam como um convite à reflexão. Ele não apenas compartilhou suas experiências, mas também levantou questões importantes sobre o papel da imprensa, os desafios políticos e as lutas sociais no Brasil. Seu relato é um lembrete do impacto que jornalistas podem ter ao registrar a história e contribuir para a construção de uma sociedade mais consciente.
Chapelin encerrou a entrevista com uma mensagem de otimismo. “Apesar de todas as dificuldades, acredito que o Brasil tem força para superar seus problemas. É preciso diálogo, respeito e união para construirmos um futuro melhor. Eu ainda espero ver isso acontecer.”